O primeiro registro do uso de animais com propósitos terapêuticos na sociedade ocidental moderna data do final do século XVIII, na Inglaterra. No Retiro de York, uma instituição psiquiátrica, animais eram mantidos nos pátios onde os pacientes podiam passear e interagir com eles. Embora de maneira ainda rudimentar, essa prática inicial já mostrava os primeiros sinais dos efeitos positivos que o contato com animais poderia ter no tratamento de distúrbios mentais.
No Brasil, a terapia assistida por animais começou a ser explorada na década de 1950 pela renomada psiquiatra Dra. Nise da Silveira. Trabalhando no Centro Psiquiátrico Dom Pedro II, no Rio de Janeiro, ela percebeu o impacto positivo da interação entre um paciente esquizofrênico e uma cadela adotada. Esse simples episódio foi o ponto de partida para o desenvolvimento do conceito de “afeto catalisador”, em que os animais funcionam como co-terapeutas, ajudando os pacientes a restabelecerem o contato com a realidade.
Dra. Nise da Silveira acreditava que o comportamento constante e não invasivo dos animais, aliado ao vínculo afetivo que se formava entre eles e os pacientes, contribuía para a recuperação emocional dos internos. O contato com os cães oferecia um ponto de referência no mundo externo, essencial para quem enfrentava doenças mentais graves. A abordagem inovadora da Dra. Nise não apenas abriu portas para o uso de animais no tratamento psiquiátrico no Brasil, mas também consolidou a prática terapêutica como uma aliada valiosa.
Expansão e desafios do SAA
A Patas Therapeutas é uma associação sem fins lucrativos, fundada em 2012, que atua com Serviços Assistidos por Animais. A ONG tem como missão oferecer os benefícios dos efeitos da convivência com animais, trazendo resultados cientificamente comprovados para a saúde física, emocional, mental e social das pessoas com diversas patologias ou mesmo sadias. “Levamos animais em hospitais, até em UTI, instituições de longa permanência de idosos (ILPI), casas de acolhimento de crianças e adolescente (SAICA) e Polícia Militar, entre outros, com o objetivo da melhora da qualidade de vida das pessoas”, conta Silvana Fedeli Prado, fundadora e presidente da ONG.
“Seguimos o Bem-estar Único, pois fazemos parte da IAHAIO, Organização Internacional de Interação Humano-Animal: o bem-estar do assistido, a do tutor/profissional e a do animal”, completa.
O SAA tem três modalidades: o programa de serviço assistido por animais (PSAA), o tratamento assistido por animais (TAA) e a educação assistida por animais (EAA).
- O PSAA é uma modalidade mais livre, podendo atuar qualquer pessoa com capacitação para a atividade em questão;
- A TAA precisa ser um profissional da saúde atuante na atividade, podendo ter uma equipe com pessoas da área ou não, mas todos capacitados;
- A EAA demanda um profissional da área da educação, podendo ter uma equipe com pessoas da área ou não, mas todos capacitados.
Um desafio constante é a preocupação com a saúde e a segurança nos ambientes onde os animais estão presentes, como hospitais e instituições de saúde. O risco de transmissão de zoonoses – doenças que podem ser transmitidas entre animais e humanos – é uma preocupação constante. Por isso, é crucial que sejam implementadas e monitoradas estratégias rigorosas de controle de infecção.
“Qualquer animal doméstico pode vir a ser um animal terapeuta. Ele precisa ter um perfil adequado para este trabalho, além de capacitação, ou seja, ser afetivo com as pessoas e demais animais, não pode ser reativo, ou seja, ter mordido ou querer morder pessoas e outros animais, equilíbrio emocional, socialização e dessensibilização nos 5 sentidos, gostar de trabalhar, sempre primando o bem-estar do animal. Já existem muitos animais trabalhando atualmente no Brasil e no mundo: cavalos, burros, lhamas, bodes, cabras, ovelhas, porcos, galinhas, porquinho da índia, aves, peixes, etc. Mas todos devem seguir os quesitos mencionados acima”, explica Prado
A terapia assistida por animais, apesar dos desafios, continua a se expandir e a oferecer resultados extraordinários. Graças a pioneiros como a Dra. Nise da Silveira, essa prática tem ajudado milhares de pessoas a encontrar conforto e apoio em seus caminhos de reabilitação e cura, provando que os laços entre humanos e animais podem ser muito mais do que simples convivência — eles podem ser verdadeiramente terapêuticos.